21 de maio de 2023

Sá de Miranda - poeta

 

Que Farei quando Tudo Arde?

Desarrezoado amor, dentro em meu peito,
tem guerra com a razão. Amor, que jaz
i já de muitos dias, manda e faz
tudo o que quer, a torto e a direito.

Não espera razões, tudo é despeito,
tudo soberba e força; faz, desfaz,
sem respeito nenhum; e quando em paz
cuidais que sois, então tudo é desfeito.

Doutra parte, a Razão tempos espia,
espia ocasiões de tarde em tarde,
que ajunta o tempo; enfim vem o seu dia:

Então não tem lugar certo onde aguarde
Amor; trata traições, que não confia
nem dos seus. Que farei quando tudo arde?

Sá de Miranda (1481-1558), in 'Antologia Poética'
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Para Sá de Miranda, a poesia não é uma ocupação para ócios de intelectual ou de salões, como para os poetas que o antecederam, mas uma missão sagrada. O poeta é como um profeta, deve denunciar os vícios da sociedade, sobretudo da Corte, o abandono dos campos e a preocupação exagerada do luxo, que tudo corrompe, deve propor a vida sadia em contacto com a «madre» natureza, a simplicidade e a felicidade dos lavradores.

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