17 de março de 2024

Uma laranja (poema)









Natália Correia / uma laranja para Alberto Caeiro


Venho simplesmente dizer

que uma laranja é uma laranja

e comove saber que não é ave

se o fosse não seriam ambas

uma só coisa volátil e doce

de que a ave é o impulso de partir

e a laranja o instinto de ficar.


Não sei de nada mais eterno

do que haver sempre uma só coisa

e ela ser muitas diferentes

e cada coisa ternamente ocupar

só o espaço que pode rodeada

pelo espaço que a pode rodear.


Sei que depois da laranja

a laranja poderá ser até

mesmo laranja se necessária

mas cada vez que o for

sê-lo-á rigorosamente

como se de laranja fosse

a exacta fome inadiável.


De ser laranja gomo a gomo

o íntimo pomo se enternece

e não cabe em si de amor

embriagada de saber

que a sua morte nos será doce.





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