30 de outubro de 2024

Nós, poetas










Nós, poetas e amantes 

o que sabemos do amor? 

Temos o espanto na retina 

diante da morte e da beleza. 

Somos humanos e frágeis 

mas antes de tudo, sós.


Somos inimigos.

Inimigos com muralhas

de sombra sobre os ombros.

E sonhamos. Às vezes

damos as mãos àqueles

que estão chorando.

(os que nunca choraram por nós)


Ah, meus irmãos e irmãs...

Ai daqueles que nos amam

e que por amor de nós se perdem.

Ah, pudéssemos amar um homem

ou uma mulher ou uma coisa...

Mas diante de nós, o tempo

se consome, desaparece e não para.


Ouvi: que vossos olhos se inundem

de pranto e água de todo o mundo!

Somos humanos e frágeis

mas antes de tudo, sós.


Hilda Hilst, 

 "XX" (Balada do festival)

              ******


"XV"

Haverá sempre o medo

e o escondido pranto

no meu canto de amor.

Dos homens e da morte

mais noite que auroras

em verso e pensamento

concebi. Nas crianças

amei os olhos e o riso

o clamor sem ouvido

o medo, o medo, 

Se a fantasia

aproximar de mim

a tua presença,

fica. A teu lado,

serei amante sem desejo:

Pássaro sem asa.

Submerso leito.


Hilda Hilst, 

in Balada do Festival

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