22 de novembro de 2024

DEIXAR ANDAR

SOBRE A PASSIVIDADE DOS PORTUGUESES 


"Isto não pode continuar", "Isto tem de mudar" e "Não há saída", com a variante "Não há homens", são com certeza as mais velhas frases da política portuguesa moderna, e as mais repetidas.

Também, no tempo em que se liam livros, se costumava citar a sentença final sobre a pátria dos grandes portugueses. A de Afonso de Albuquerque e a de Camões, claro. Mas sobretudo o «Isto dá vontade de morrer>>> de Herculano (inventada por Bulhão Pato) e o exasperado testamento de Joaquim António de Aguiar: «É muito triste nascer entre estúpidos, viver entre estúpidos, morrer entre estúpidos>> (provavelmente inventada por um jornal qualquer). Do lado da arte, as coisas não foram melhores. Camilo deu um tiro na cabeça. Antero deu um tiro na cabeça. Oliveira Martins, que escreveu dois breviários clássicos do pessimismo indígena, a História de Portugal e o Portugal Contemporâneo, achou o governo «uma cloaса». Е de Eça nem vale a pena falar: fora o bacalhau e o arroz de cabidela, não estimava, como ele dizia, este «sítio».

***

Nenhuma força, nenhuma causa, é capaz de abalar a resistência da passividade nacional.

Estamos bem connosco e, quanto ao resto, o melhor é deixar andar."


Vasco Pulido Valente (Vasco Valente Correia Guedes, Lisboa, 21 de Novembro de 1941-21 de Fevereiro de 2020), historiador, ensaísta, escritor, cronista e comentador político, 

in 'De Mal a Pior'.


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