29 de maio de 2008
27 de maio de 2008
26 de maio de 2008
A fome
20 de maio de 2008
David Mourão-Ferreira
E por vezes as noites duram meses
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes
encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes
ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos
E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se envolam tantos anos.
E por vezes os meses oceanos
E por vezes os braços que apertamos
nunca mais são os mesmos E por vezes
encontramos de nós em poucos meses
o que a noite nos fez em muitos anos
E por vezes fingimos que lembramos
E por vezes lembramos que por vezes
ao tomarmos o gosto aos oceanos
só o sarro das noites não dos meses
lá no fundo dos copos encontramos
E por vezes sorrimos ou choramos
E por vezes por vezes ah por vezes
num segundo se envolam tantos anos.
Um cansaço
O que há em mim é sobretudo cansaço
Não disto nem daquilo,
Nem sequer de tudo ou de nada:
Cansaço assim mesmo, ele mesmo,
Cansaço.
A subtileza das sensações inúteis,
As paixões violentas por coisa nenhuma,
Os amores intensos por o suposto alguém.
Essas coisas todas
-Essas e o que faz falta nelas eternamente;
Tudo isso faz um cansaço,
Este cansaço,
Cansaço.
Há sem dúvida quem ame o infinito,
Há sem dúvida quem deseje o impossível,
Há sem dúvida quem não queira nada
-Três tipos de idealistas, e eu nenhum deles:
Porque eu amo infinitamente o finito,
Porque eu desejo impossivelmente o possível,
Porque eu quero tudo, ou um pouco mais, se puder ser,
Ou até se não puder ser...E o resultado?
Para eles a vida vivida ou sonhada,
Para eles o sonho sonhado ou vivido,
Para eles a média entre tudo e nada, isto é, isto...
Para mim só um grande, um profundo,
E, ah com que felicidade infecundo, cansaço,
Um supremíssimo cansaço.
Íssimo, íssimo. íssimo,
Cansaço...
Álvaro de Campos
16 de maio de 2008
Em Destaque
A minha avó tinha uma frigideira. Daquelas granjolas e metálicas que o tempo enegrece. Que tanto lhe dava para fritar pastelinhos de bacalhau como para a erguer à frente do nariz do marido caso ele a enxofrasse. Tinham casado mais de uma década antes da segunda guerra mundial mas não era qualquer um lá por ter um afilamento esponjoso que lhe metia medo que o temor só lhe crescia na mão para agitar o cabo do utensílio.Ela e a frigideira eram amigas de longa data. Desde nova, lá pelos idos de mil novecentos e pouco que tinha ido como era costume dizer-se servir para casa de uns senhores e os filhos e o dono daquele património não lhe largavam as saias a insistir que o sexo fazia parte do serviço doméstico e ela que não era boa de assoar desatou a distribuir frigideirada que patrões há muitos, como os chapéus e corpinho só temos o nosso e mais nenhum.Se a minha avó agora visse as jovens a aceitar estalada dos namorados como quem se conforma com o nome que lhe deram no registo civil ou mãozinhas lúbricas de chefias à rédea solta para não engrossar as filas das desempregadas julgo que tentaria um patrocínio da Tefal para distribuição de frigideiras desde o jardim infantil.
Autoria: Maria_Arvore
15 de maio de 2008
Em Destaque
Se encontro uma musa
Que entenda de poetas,
De vôos infinitos,
De portos impossíveis,
De naufrágios,
E de pura insensatez,
Minha poesia
Se fará eterna!
Autoria: Angela Schnoor
Que entenda de poetas,
De vôos infinitos,
De portos impossíveis,
De naufrágios,
E de pura insensatez,
Minha poesia
Se fará eterna!
Autoria: Angela Schnoor
Já é o tempo das cerejas ?
Não sei se as cerejas que já se vendem por aí, bastante caras é verdade, são de algum modo amadurecidas artificialmente.
Nem sei se vieram de longe, de outras terras, de outros climas.
Só sei que, aqui por Lisboa, a meio do mês de Maio, com fartura de chuva e tempo fresco, quase me apetece calçar estas meias bonitas que me enviaram por e_mail:
14 de maio de 2008
Em Destaque
breve VI
gostava que fosses o céu e eu a montanha;
o beijo era o tempo por inteiro e,
encontrávamo-nos todos os dias ao pôr-do-sol;
porque ao nascer do dia nos tocávamos sempre.
Autoria: António Paiva
De Bichinhos
Eugénio de Andrade
Em Abril chegam os gatos:
à frente o mais antigo,
eu tinha dez anos ou nem isso,
um pequeno tigre
que nunca se habituou às areias do caixote,
mas foi quem primeiro
me tomou o coração de assalto.
Veio depois, já em Coimbra,
uma gata que não parava em casa:
fornicava e paria no pinhal,
não lhe tive afeição que durasse,
nem ela a merecia, de tão puta.
Só muitos anos depois entrou em casa,
para ser senhora dela,
o pequeno persa azul.
A beleza vira-nos a alma
do avesso e vai-se embora.
Por isso, quem me lambe a ferida aberta
que me deixou a sua morte
é agora uma gatita rafeira e negra
com três ou quatro borradelas de cal na barriga.
É ao sol dos seus olhos
que talvez aqueça as mãos,
e partilhe a leitura do Público ao domingo.
Regressada à Cidade
Nublado ou com aguaceiros, não importa!
Tive um largo fim de semana, que me proporcionou também boas abertas.
E então nas tardes, naquele areal todo, éramos quatro ou cinco e mais os meus livritos:
Houve trabalhos a fazer, incluindo cuidar das plantas e do bichinho.
Só afazeres daqueles mesmo, mesmo com data e hora marcada me trouxeram de volta!
9 de maio de 2008
8 de maio de 2008
Já me preocupo
Pessoas com quem eu achava que não tinha muito em comum, começam a exprimir opiniões sobre questões de política e governação com que tenho de concordar.
Além de me surpreender, começa a deixar-me preocupada.
A gente espera que os comunistas e os Verdes e o Bloco estejam sempre no contra em relação a questões laborais, ambientais, salariais, enfim, são oposição, muitas vezes com razão.
Mas no tocante a questões sociais, quando ouço Manuela Ferreira Leite (que tanto fez apertar o cinto aos portugueses) e sou obrigada a concordar com afirmações que ela faz, quando leio Maria José Nogueira Pinto, no DN de hoje, e sou obrigada a concordar, pergunto-me se este governo ainda se lembra do que era a essência de ser de esquerda?!
E, afinal, até descobri que a diferença entre Sócrates e Ferreira Leite não é só a óbvia - a senhora não teria nunca pensado em mexer nos certificados de aforro, e a Sócrates, nem esses escaparam.
Além de me surpreender, começa a deixar-me preocupada.
A gente espera que os comunistas e os Verdes e o Bloco estejam sempre no contra em relação a questões laborais, ambientais, salariais, enfim, são oposição, muitas vezes com razão.
Mas no tocante a questões sociais, quando ouço Manuela Ferreira Leite (que tanto fez apertar o cinto aos portugueses) e sou obrigada a concordar com afirmações que ela faz, quando leio Maria José Nogueira Pinto, no DN de hoje, e sou obrigada a concordar, pergunto-me se este governo ainda se lembra do que era a essência de ser de esquerda?!
E, afinal, até descobri que a diferença entre Sócrates e Ferreira Leite não é só a óbvia - a senhora não teria nunca pensado em mexer nos certificados de aforro, e a Sócrates, nem esses escaparam.
Em Destaque
às armas!... às armas!...
Portugal nunca teve um Império; mas há muita gente convencida que ele ainda existe.
Dito que é amanhã, 9 de Maio, o Dia da Europa, o Presidente da República Portuguesa vai assinar o Decreto de Ratificação do Tratado de Lisboa, subscrito pelos 27 membros da União Europeia.Lá para o fim do ano, uma vez ratificado por todos os 27, o mapa do mar português, seja no Continente, arquipélago da Madeira ou Açores, encolhe substancialmente de acordo com a Política Comum de Pescas que atribui a Bruxelas a competência exclusiva para a conservação dos recursos biológicos do mar.
O senhor Laurentino Dias disse, na semana passada, que Portugal e Espanha deveriam apresentar conjuntamente a candidatura ao Mundial de Futebol. Como o Primeiro-ministro foi, na altura, o guru da ideia do Euro 2004 da qual resultou a sua belissima colecção de dez estádios, não é crível que o senhor Laurentino Dias, desta feita, tenha falado só por falar.Agora sim, a falar só por falar, eu aposto que a Casquicheia de Baixo vai ter, finalmente, o seu estádio!...
Autoria: tinta permanente
Portugal nunca teve um Império; mas há muita gente convencida que ele ainda existe.
Dito que é amanhã, 9 de Maio, o Dia da Europa, o Presidente da República Portuguesa vai assinar o Decreto de Ratificação do Tratado de Lisboa, subscrito pelos 27 membros da União Europeia.Lá para o fim do ano, uma vez ratificado por todos os 27, o mapa do mar português, seja no Continente, arquipélago da Madeira ou Açores, encolhe substancialmente de acordo com a Política Comum de Pescas que atribui a Bruxelas a competência exclusiva para a conservação dos recursos biológicos do mar.
O senhor Laurentino Dias disse, na semana passada, que Portugal e Espanha deveriam apresentar conjuntamente a candidatura ao Mundial de Futebol. Como o Primeiro-ministro foi, na altura, o guru da ideia do Euro 2004 da qual resultou a sua belissima colecção de dez estádios, não é crível que o senhor Laurentino Dias, desta feita, tenha falado só por falar.Agora sim, a falar só por falar, eu aposto que a Casquicheia de Baixo vai ter, finalmente, o seu estádio!...
Autoria: tinta permanente
Um abraço
Gosto desta T-shirt!
Ela está ligada a uma boa causa e isso já a torna atraente.
Mas há a frase, tão bonita, "Dá-me um abraço".
Um abraço é um gesto de ternura, carinho, alegria, encontro, partilha de afecto!
Claro que falo de abraços genuínos, não daqueles de circunstância, que são seguidos da ligeira palmadinha nas costas...
7 de maio de 2008
Em Destaque
Final de vida
Foto : Patologista
Foto : Patologista
O Rio Tua ainda corre livremente. Sem qualquer impedimento. E está rodeado de uma beleza singular. A natureza impera por aqueles lados. E o silêncio também. Mas tudo isso vai acabar. O nosso governo decidiu construir aí mais uma barragem. E lá vai toda a vida selvagem que por ali resiste, desaparecer ou, pelo menos, sofrer grandes danos. O melhor é aproveitar enquanto podemos. Depois de o homem lhe deitar a mão ficará estragado para todo o sempre. As usual...
Autoria: Patologista
Fatal como o destino
6 de maio de 2008
Em Destaque
A Porta Da Minha Alma
I - Ideal de vida
“Deixai os outros acumular o seu tesouro de ouro amarelo, deixai que deles sejam muitos acres de solo bem arado; deixai-os viver em constantes conflitos e alarmes… mas deixai que a humilde fortuna que é a minha me conduza a uma vida tranquila, para que na minha lareira brilhe um fogo constante.”
(Albio Túbilo, poeta latino que viveu entre 54 a.C. e 18 a.C. in Elegias – contemporâneo de Horácio e Ovídeo e cognominado “O poeta perfeito” pela simplicidade das suas palavras)
II - Compromisso
Pertence-te
Ser homem, afirmar
Todos os dias que tens
Um compromisso: ser claro
E brando como a luz
E, como ela,
Necessário. E não deixar
Crescer à tua porta
Ervas daninhas.
(Albano Martins in Frágeis São As Palavras)
I - Ideal de vida
“Deixai os outros acumular o seu tesouro de ouro amarelo, deixai que deles sejam muitos acres de solo bem arado; deixai-os viver em constantes conflitos e alarmes… mas deixai que a humilde fortuna que é a minha me conduza a uma vida tranquila, para que na minha lareira brilhe um fogo constante.”
(Albio Túbilo, poeta latino que viveu entre 54 a.C. e 18 a.C. in Elegias – contemporâneo de Horácio e Ovídeo e cognominado “O poeta perfeito” pela simplicidade das suas palavras)
II - Compromisso
Pertence-te
Ser homem, afirmar
Todos os dias que tens
Um compromisso: ser claro
E brando como a luz
E, como ela,
Necessário. E não deixar
Crescer à tua porta
Ervas daninhas.
(Albano Martins in Frágeis São As Palavras)
Autoria: Manuel Maria
Açucenas?
Aromas que não há...
Nesta noite de açucenas.
Se as rosas sempre foram consideradas símbolo de amor, de afectos especiais, estas flores que julgo chamarem-se açucenas, além de pureza, podem representar mais o quê?
Nesta noite de açucenas.
Se as rosas sempre foram consideradas símbolo de amor, de afectos especiais, estas flores que julgo chamarem-se açucenas, além de pureza, podem representar mais o quê?
O amor de pais por filhos, amores platónicos, amizades incondicionais?
Quem souber que o diga.
Pessoalmente, acho-as lindas, lindas, e atribuo-lhes sempre um certo poder mágico, que me faz acreditar em coisas boas.
Todos temos direito às nossas fantasias e esta é minha.
5 de maio de 2008
Concessões
Se queres
Em Destaque
Nélida Piñón - um Conto
I love my husband
I love my husband
Eu amo meu marido. De manhã à noite. Mal acordo, ofereço-lhe café. Ele suspira exausto da noite sempre maldormida e começa a barbear-se. Bato-lhe à porta três vezes, antes que o café esfrie. Ele grunhe com raiva e eu vocifero com aflição. Não quero meu esforço confundido com um líquido frio que ele tragará como me traga duas vezes por semana, especialmente no sábado.
Depois, arrumo-lhe o nó da gravata e ele protesta por consertar-lhe unicamente a parte menor de sua vida. Rio para que ele saia mais tranqüilo, capaz de enfrentar a vida lá fora e trazer de volta para a sala de visita um pão sempre quentinho e farto.
Ele diz que sou exigente, fico em casa lavando a louça, fazendo compras, e por cima reclamo da vida. Enquanto ele constrói o seumundo com pequenos tijolos, e ainda que alguns destes muros venham ao chão, os amigos o cumprimentam pelo esforço de criarolarias de barro, todas sólidas e visíveis.
A mim também me saúdam por alimentar um homem que sonha com casas-grandes, senzalas e mocambos, e assim faz o país progredir. E é por isto que sou a sombra do homem que todos dizem eu amar. Deixo que o sol entre pela casa, para dourar os objetos comprados com esforço comum. Embora ele não me cumprimente pelos objetos fluorescentes. Ao contrário, através da certeza do meu amor, proclama que não faço outra coisa senão consumir o dinheiro que ele arrecada no verão. Eu peço então que compreenda minha nostalgia por uma terra antigamente trabalhada pela mulher, ele franze o rosto como se eu lhe estivesse propondo uma teoria que envergonha a família e a escritura definitiva do nosso apartamento.
O que mais quer, mulher, não lhe basta termos casado em comunhão de bens? E dizendo que eu era parte do seu futuro, que só ele porém tinha o direito de construir, percebi que a generosidade do homem habilitava-me a ser apenas dona de um passado com regras ditadas no convívio comum.
Ler continuação ---> aqui
Autoria: JG
4 de maio de 2008
Dia da Mãe
2 de maio de 2008
Em Destaque
O Primeiro Dia de Maio
E não lembrei mais nada de tão certo e venerável
como este gesto, orgulhoso e ardente.
Dum homem que cuida a terra e as plantas.
Que poderia ser um pedreiro, um empregado qualquer, um escritor.
Poderia ser uma fila de gente sem emprego, com um papel na mão.
Em nome deles e da única força que têm: a do trabalho.
Em nome de todo os Maios em que o primeiro dia é festivo.
Uma camélia invulgar e viva, na mão que a fez nascer.
Autoria: bettips
E não lembrei mais nada de tão certo e venerável
como este gesto, orgulhoso e ardente.
Dum homem que cuida a terra e as plantas.
Que poderia ser um pedreiro, um empregado qualquer, um escritor.
Poderia ser uma fila de gente sem emprego, com um papel na mão.
Em nome deles e da única força que têm: a do trabalho.
Em nome de todo os Maios em que o primeiro dia é festivo.
Uma camélia invulgar e viva, na mão que a fez nascer.
Autoria: bettips
Pensava ele
La Rochefoucauld (1613-1680)
Adversário de Richelieu, escritor, via no egoísmo a justificação dos comportamentos humanos.
"O interesse é a alma do amor-próprio, de modo que, tal como o corpo privado da sua alma não vê, não ouve, não conhece, não sente e não se move, o amor-próprio, se pode assim dizer-se, separado dos seus interesses, não vê, não escuta, não sente e não se move. Daí que um homem que corra a terra e os mares para seu benefício fique de repente paralisado para os interesses dos outros e daí, também, o adormecimento em que cai de repente, tal como esta espécie de morte que provocamos a todos aqueles a quem narramos a nossa vida. Daí vem também a rápida ressurreição quando na nossa narrativa pomos qualquer coisa que lhes diga respeito, de modo que vemos nas nossas conversas e nos nossos tratados que, no mesmo instante, um homem adormece e volta a si, consoante o interesse se aproxima ou se afasta dele."
***********************************
Nada é mais hipócrita do que pedir ou dar conselhos. Quem pede, parece ter um respeito venerando pelos sentimentos do amigo a quem os pede, mas, no fundo, quer é fazer aprovar os sentimentos próprios e, assim, tornar o outro responsável pela sua conduta. Por outro lado, o que presta os conselhos retribui a confiança que lhe é dada, com um zelo ardente e desinteressado, apesar de, quase sempre, querer, através dos conselhos que dá, satisfazer os seus interesses ou a sua glória.
************************************
O amor é uma imagem da nossa vida. Tanto o primeiro como a segunda estão sujeitos às mesmas revoluções e mudanças. A sua juventude é resplandecente, alegre e cheia de esperanças porque somos felizes por ser jovens tal como somos felizes por amar. Este agradabilíssimo estado leva-nos a procurar outros bens muito sólidos. Não nos contentamos nessa fase da vida com o facto de susbsistirmos, queremos progredir, ocupamo-nos com os meios para nos aperfeiçoarmos e para assegurar a nossa boa sorte. Procuramos a protecção dos ministros, mostrando-nos solícitos e não aguentamos que outrem queira o mesmo que temos em vista. Este estímulo cumula-nos de mil trabalhos e esforços que logo se apagam quando alcançamos o desejado. Todas as nossas paixões ficam então satisfeitas e nem por sombras podemos imaginar que a nossa felicidade tenha fim.
No entanto, esta felicidade raramente dura muito e fatiga-se da graça da novidade. Para possuirmos o que desejámos não paramos de desejar mais e mais. Habituamo-nos ao que temos, mas os mesmos haveres não conservam o seu preço, como nem sempre nos tocam do mesmo modo. Mudamos imperceptivelmente sem disso nos apercebermos. O que já adquirimos torna-se parte de nós mesmos e sofreríamos muito com a sua perda, mas já não somos sensíveis ao prazer de conservar o adquirido. A alegria já não é viva, procuramos noutro lado que não naquele que tanto desejámos. Esta inconstância involuntária acontece com o tempo que, sem querermos, não perdoa: mexe no nosso amor e na nossa vida. Apaga sub-repticiamente dia-a-dia algo da nossa juventude e da nossa alegria, destruindo os nossos maiores encantos. Tornamo-nos mais circunspectos e juntamos negócios às paixões. O amor já não subsiste por si mesmo, indo alimentar-se de ajudas exteriores. Este estádio do amor corresponde àquela idade em que começamos a ver por onde devemos acabar com ele, mas não temos a força para acabar directamente. No declínio, no amor como no da vida, ninguém quer resolver-se a evitar a maneira de prevenir os desgostos que ainda estão por vir; ainda se vive para aceitar os males futuros, mas não para os prazeres. Os ciúmes, a desconfiança, o medo de nos tornarmos maçadores e o medo que nos abandonem são males ligados à velhice do amor, tal como as doenças se agarram à demasiado longa duração da vida. Nesta idade, sentimo-nos viver, porque sentimos que estamos doentes, como só sabemos que estamos apaixonados quando sentimos as penas do amor. Só se sai do adormecimento das relações demasiado longas pelo enfado e pelo desgosto de ainda nos vermos agarrados. Enfim, de todas as decrepitudes, a do amor é a mais insuportável.
in 'Reflexões'
No entanto, esta felicidade raramente dura muito e fatiga-se da graça da novidade. Para possuirmos o que desejámos não paramos de desejar mais e mais. Habituamo-nos ao que temos, mas os mesmos haveres não conservam o seu preço, como nem sempre nos tocam do mesmo modo. Mudamos imperceptivelmente sem disso nos apercebermos. O que já adquirimos torna-se parte de nós mesmos e sofreríamos muito com a sua perda, mas já não somos sensíveis ao prazer de conservar o adquirido. A alegria já não é viva, procuramos noutro lado que não naquele que tanto desejámos. Esta inconstância involuntária acontece com o tempo que, sem querermos, não perdoa: mexe no nosso amor e na nossa vida. Apaga sub-repticiamente dia-a-dia algo da nossa juventude e da nossa alegria, destruindo os nossos maiores encantos. Tornamo-nos mais circunspectos e juntamos negócios às paixões. O amor já não subsiste por si mesmo, indo alimentar-se de ajudas exteriores. Este estádio do amor corresponde àquela idade em que começamos a ver por onde devemos acabar com ele, mas não temos a força para acabar directamente. No declínio, no amor como no da vida, ninguém quer resolver-se a evitar a maneira de prevenir os desgostos que ainda estão por vir; ainda se vive para aceitar os males futuros, mas não para os prazeres. Os ciúmes, a desconfiança, o medo de nos tornarmos maçadores e o medo que nos abandonem são males ligados à velhice do amor, tal como as doenças se agarram à demasiado longa duração da vida. Nesta idade, sentimo-nos viver, porque sentimos que estamos doentes, como só sabemos que estamos apaixonados quando sentimos as penas do amor. Só se sai do adormecimento das relações demasiado longas pelo enfado e pelo desgosto de ainda nos vermos agarrados. Enfim, de todas as decrepitudes, a do amor é a mais insuportável.
1 de maio de 2008
Em Destaque
a fome é tanta,
que os olhos lhe caiem na sopa
o frio é tanto,
que a manta rota lhe parece um embuste
a dor é tanta,
que o sangue lhe verte das órbitas vazias
o abandono é tanto,
que se resigna à monotonia das insónias,
ouvindo noites a fio o barulho do relógio da torre,
marcando implacavelmente,
os segundos de uma morte em vida
a raiva é tanta que grita:
que sabeis vós poetas de circunstância?
que tanto cantais a vossa dor,
uma dor tantas vezes mentirosa
Autoria: António Paiva
Venho de longe
Venho de longe, de muito longe.
Cheguei a um lugar diferente e tenho vontade de ficar.
Dou as boas-vindas a quem por aqui passar.
Não há porta nem cancela. Sorrio a quem vier por bem.
Cheguei a um lugar diferente e tenho vontade de ficar.
Dou as boas-vindas a quem por aqui passar.
Não há porta nem cancela. Sorrio a quem vier por bem.
Irei criar aqui uma nova rubrica, a que chamarei "Em Destaque", onde irei mostrar imagens ou textos de outros blogues que costumo visitar e que me tenham impressionado, seja pela qualidade da escrita, humor, ironia, beleza, inesperado, enfim, qualquer coisa que me tenha feito meditar, rir, sorrir ou sentir.
Tendo, entre outros, o vício de fotografar tudo e nada, com modestíssima qualidade mas com muito prazer, vai continuar a haver fotos de lugares e objectos, de insignificâncias ou de monumentalidades.
Neste espaço em que nunca perdi nada e ganhei algumas simpatias e amizades, e por ser hoje o 1º de Maio, aos amigos que vierem e à relevância histórica da data, saúdo com flores e frutos.
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