Os mortos
Não há mortos que morram tanto como os nossos.
Se um daqueles que nos pertence morre sete
ou setenta vezes no coração,
de quem apenas ouvimos falar morre uma vez, na sua data,
e os que sempre viveram longe
morrem-nos metade ou um oitavo. E metade
de uma morte é quase nada, são casas
decimais no sofrimento. (Que digo? Milésimas, milésimas!)
***********
OS GRUPOS
Mas é estranho isto, e receio o que a vida vai
Fazendo de mim sem a minha autorização.
Com 18 anos adorava mesas grandes, divertia-me,
Via no grupo movimentos e excitações a que
Não chegava sozinho. Como se a alegria entre
Vinte pessoas fosse uma língua que um ser vivo
Isolado não conseguisse formular.
Não morrerei ignorando essa língua, mas agora
Fujo dela: cinco pessoas numa mesa assustam-me
Como um assalto: dá-me!, sinto que me dizem,
E a expectativa dos outros em relação à minha frase,
Ao meu silêncio ou à minha imobilidade,
Encosta o seu frio à minha camisa,
Como o punhal discreto de um bom assaltante.
Não gosto de grupos, de aglomerações intermédias
Entre a amizade e o exército. A amizade faz-se de um
Para um, por vezes de dois para um; em matéria de sinceridade
O número quatro assusta-me.
Gonçalo M. Tavares
Sem comentários:
Enviar um comentário