***
Se soubesses como ainda amo as rosas,
talvez não enchesses as horas de pesadelos.
Mas tu esqueceste muita coisa;
esqueceste que as minhas pernas cresceram,
que todo o meu corpo cresceu,
e até o meu coração ficou enorme, mãe!
Olha queres ouvir-me?
às vezes ainda sou o menino
que adormeceu nos teus olhos;
ainda aperto contra o coração
rosas tão brancas como as que tens na moldura;
ainda oiço a tua voz:
Era uma vez uma princesa no meio de um laranjal...
Mas tu sabes a noite é enorme,
e todo o meu corpo cresceu.
Eu saí da moldura,
dei às aves os meus olhos a beber,
Não me esqueci de nada, mãe.
Guardo a tua voz dentro de mim.
E deixo-te as rosas.
Boa noite. Eu vou com as aves.
Eugénio de Andrade,
in "Os Amantes Sem Dinheiro"
Sem comentários:
Enviar um comentário