15 de junho de 2024

Não à violência sobre os idosos


 A VELHICE PEDE DESCULPAS


Tão velho estou como árvore no inverno,
vulcão sufocado, pássaro sonolento. 
Tão velho estou, de pálpebras baixas, acostumado apenas ao som das músicas, à forma das letras.

Fere-me a luz das lâmpadas, o grito frenético dos provisórios dias do mundo: 
Mas há um sol eterno, eterno e brando e uma voz que não me canso, muito longe, de ouvir.

Desculpai-me esta face, que se fez resignada: 
já não é a minha, mas a do tempo, 
com seus muitos episódios.

Desculpai-me não ser bem eu: mas um fantasma de tudo.
Recebereis em mim muitos mil anos, é certo, com suas sombras, porém, suas intermináveis sombras.

Desculpai-me viver ainda: que os destroços, mesmo os da maior glória, 
são na verdade só destroços, destroços.

Cecília Meireles, in 'Poemas'

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