30 de junho de 2024

Renascendo






Voltei a nascer. Hoje. De mim mesmo. Eu, que fui pássaro e fui réptil. 

E já fui tojo e andorinha. Durante oito séculos, oliveira. E fui irmão de todas as cegonhas.

Também fui rato, minhoca, cão, raposa e tartaruga. E já fui figueira. E cedro.

E fui um jovem loureiro. Por mais de cem anos, uma acácia.

Por pouco tempo um barbo, brilhante e ruivo. E fui também a mais estouvada das medusas. E mirtilo. E musgo. E macieira.

E gostei de ser um lobo. E um solitário castanheiro.

Fui mais tarde, mirto, melro, molusco, gaivota, gato, lírio, giesta, medronheiro. No início fui alga. A seguir, albatroz.

Depois escaravelho, pintassilgo, lebre e hortelã. Cheguei a acordar roseira. Mas igualmente plátano, boca-de-lobo, aloendreiro. 

E algumas vezes cardo e outras vezes trigo. Menos vezes, uma tília. Gostaria de ter sido laranjeira, mas nunca aconteceu. 

Mas já fui cerejeira por uns tempos. E abelha. Acreditem, fui abelha.

E fui também perdiz, e pombo, e fui batráquio. Não gostei, por aí além, de ser um sapo. E também não gostei de ser um cacto. 

Mas adorei ter sido uma libélula. De quando fui louva-a-deus, pouco me lembro. E recordo vagamente os tempos de coelho e de cabra e de cavalo. E de cana e de carpa, de cigarra e cotovia. 

Jacinto, também fui. E fui morcego. E fui melro. E fui poejo. Fui até, vejam bem, uma buganvília. 

As últimas lembranças, no entanto, as mais claras, são de ter sido amendoeira, águia, aranha, bicho-da-seda e beija-flor. 

Por me ter recusado, não fui víbora. E por não ter feitio, camaleão.


Joaquim Pessoa 

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