17 de novembro de 2025

Solidão


Este país não é, definitivamente, para velhos. É triste ser idoso em Portugal, e não haverá novidade nesta afirmação, mas a realidade dá-nos um murro no estômago quando chega em forma de estudo, com números e dados concretos a traduzir o que apenas julgávamos saber. O novo inquérito nacional às estruturas residenciais para pessoas idosas revela um país onde mais de metade dos residentes em lares apresentam sinais de declínio cognitivo compatíveis com demência. Um dado inquietante quando percebemos que a maioria dos profissionais nunca recebeu formação específica para cuidar destas pessoas.



O retrato ganha tons ainda mais cinzentos quando percebemos que apenas 30% dessas pessoas - e falamos de pessoas, por mais que a expressão ‘idoso’ lhes pareça roubar esse estatuto - têm diagnóstico formal. Invisíveis para o sistema, portanto. Faltam médicos, faltam condições para deslocações, e falta tempo, na mesma proporção em que sobra o improviso diário de quem cuida às cegas.


Se entre quatro paredes já é difícil, o exterior é quase ficção: apesar de 99% dos lares terem espaços ao ar livre, só um terço permite que pessoas com demência os usem livremente. A ideia de um passeio ao sol, respirar ar puro, ou ver simplesmente as vistas, é um luxo raro — 75% dos residentes vivem confinados e dizem nunca sair para o exterior. E apenas 15% recebem visitas frequentes dos filhos.


Não é um mal exclusivamente português, infelizmente. Em muitos países europeus, o cenário é semelhante: lares superlotados, profissionais exaustos, diagnósticos tardios. Na Alemanha, discute-se há anos a falta de cuidadores; em França, os escândalos de lares privados levantaram alertas sobre negligência; na Itália, os estudos mostram níveis de isolamento tão altos quanto os nossos. Mas há também exemplos felizes: países como os Países Baixos investem em “aldeias da demência”, onde o quotidiano tem mais rua do que corredores e mais autonomia do que fechaduras.


É um retrato que pede luz. Um estudo para ler, mas que também nos deve deixar a pensar, desafiando a fazer melhor. Não basta ter lares cheios, é preciso proporcionar vidas cheias, mesmo quando estas já só possam ser vividas em passos mais lentos e com a memória a falhar.

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