O escritor José Cardoso Pires cirurgicamente descreveu o estado da imprensa durante a Revolução: “Na manhã do 25 de Abril, estava Lisboa em revolução, voavam os cravos, corriam os tiros e, a dois passos do Quartel do Carmo onde Caetano se encontrava encurralado com o sumo-inquisidor Moreira Baptista, os censores do fascismo continuavam às secretárias, embalados numa rotina de meio século. A dada altura levantaram a cabeça, medindo as horas, e todos à uma desataram a telefonar para os jornais. Reclamavam as provas dos textos das edições da tarde. Estavam de tal modo viciados de autoridade, tão enraizados nos cadeirões sombrios - vivendo neles, larvando papel, reproduzindo-se - que se julgavam instituição natural, função pública. Prolongáveis para lá do fascismo que se estava a extinguir.”
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Chegamos (aos 50 anos da Revolução de Abril) também, com uma imprensa mais fraca, menos livre, ameaçada, mal paga, amordaçada por problemas de caixa, de lucro, de negócios envoltos em nevoeiro. Chegamos chegando tarde a uma assumpção do direito de possuir uma liberdade que seja de meias-tintas, porque um mundo sem jornalismo é um mundo, um país, sem contraditório.
Luciana Leiderfarb
No Expresso
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