Adversário de Richelieu, escritor, via no egoísmo a justificação dos comportamentos humanos.
"O interesse é a alma do amor-próprio, de modo que, tal como o corpo privado da sua alma não vê, não ouve, não conhece, não sente e não se move, o amor-próprio, se pode assim dizer-se, separado dos seus interesses, não vê, não escuta, não sente e não se move. Daí que um homem que corra a terra e os mares para seu benefício fique de repente paralisado para os interesses dos outros e daí, também, o adormecimento em que cai de repente, tal como esta espécie de morte que provocamos a todos aqueles a quem narramos a nossa vida. Daí vem também a rápida ressurreição quando na nossa narrativa pomos qualquer coisa que lhes diga respeito, de modo que vemos nas nossas conversas e nos nossos tratados que, no mesmo instante, um homem adormece e volta a si, consoante o interesse se aproxima ou se afasta dele."
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Nada é mais hipócrita do que pedir ou dar conselhos. Quem pede, parece ter um respeito venerando pelos sentimentos do amigo a quem os pede, mas, no fundo, quer é fazer aprovar os sentimentos próprios e, assim, tornar o outro responsável pela sua conduta. Por outro lado, o que presta os conselhos retribui a confiança que lhe é dada, com um zelo ardente e desinteressado, apesar de, quase sempre, querer, através dos conselhos que dá, satisfazer os seus interesses ou a sua glória.
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O amor é uma imagem da nossa vida. Tanto o primeiro como a segunda estão sujeitos às mesmas revoluções e mudanças. A sua juventude é resplandecente, alegre e cheia de esperanças porque somos felizes por ser jovens tal como somos felizes por amar. Este agradabilíssimo estado leva-nos a procurar outros bens muito sólidos. Não nos contentamos nessa fase da vida com o facto de susbsistirmos, queremos progredir, ocupamo-nos com os meios para nos aperfeiçoarmos e para assegurar a nossa boa sorte. Procuramos a protecção dos ministros, mostrando-nos solícitos e não aguentamos que outrem queira o mesmo que temos em vista. Este estímulo cumula-nos de mil trabalhos e esforços que logo se apagam quando alcançamos o desejado. Todas as nossas paixões ficam então satisfeitas e nem por sombras podemos imaginar que a nossa felicidade tenha fim.
No entanto, esta felicidade raramente dura muito e fatiga-se da graça da novidade. Para possuirmos o que desejámos não paramos de desejar mais e mais. Habituamo-nos ao que temos, mas os mesmos haveres não conservam o seu preço, como nem sempre nos tocam do mesmo modo. Mudamos imperceptivelmente sem disso nos apercebermos. O que já adquirimos torna-se parte de nós mesmos e sofreríamos muito com a sua perda, mas já não somos sensíveis ao prazer de conservar o adquirido. A alegria já não é viva, procuramos noutro lado que não naquele que tanto desejámos. Esta inconstância involuntária acontece com o tempo que, sem querermos, não perdoa: mexe no nosso amor e na nossa vida. Apaga sub-repticiamente dia-a-dia algo da nossa juventude e da nossa alegria, destruindo os nossos maiores encantos. Tornamo-nos mais circunspectos e juntamos negócios às paixões. O amor já não subsiste por si mesmo, indo alimentar-se de ajudas exteriores. Este estádio do amor corresponde àquela idade em que começamos a ver por onde devemos acabar com ele, mas não temos a força para acabar directamente. No declínio, no amor como no da vida, ninguém quer resolver-se a evitar a maneira de prevenir os desgostos que ainda estão por vir; ainda se vive para aceitar os males futuros, mas não para os prazeres. Os ciúmes, a desconfiança, o medo de nos tornarmos maçadores e o medo que nos abandonem são males ligados à velhice do amor, tal como as doenças se agarram à demasiado longa duração da vida. Nesta idade, sentimo-nos viver, porque sentimos que estamos doentes, como só sabemos que estamos apaixonados quando sentimos as penas do amor. Só se sai do adormecimento das relações demasiado longas pelo enfado e pelo desgosto de ainda nos vermos agarrados. Enfim, de todas as decrepitudes, a do amor é a mais insuportável.
in 'Reflexões'
No entanto, esta felicidade raramente dura muito e fatiga-se da graça da novidade. Para possuirmos o que desejámos não paramos de desejar mais e mais. Habituamo-nos ao que temos, mas os mesmos haveres não conservam o seu preço, como nem sempre nos tocam do mesmo modo. Mudamos imperceptivelmente sem disso nos apercebermos. O que já adquirimos torna-se parte de nós mesmos e sofreríamos muito com a sua perda, mas já não somos sensíveis ao prazer de conservar o adquirido. A alegria já não é viva, procuramos noutro lado que não naquele que tanto desejámos. Esta inconstância involuntária acontece com o tempo que, sem querermos, não perdoa: mexe no nosso amor e na nossa vida. Apaga sub-repticiamente dia-a-dia algo da nossa juventude e da nossa alegria, destruindo os nossos maiores encantos. Tornamo-nos mais circunspectos e juntamos negócios às paixões. O amor já não subsiste por si mesmo, indo alimentar-se de ajudas exteriores. Este estádio do amor corresponde àquela idade em que começamos a ver por onde devemos acabar com ele, mas não temos a força para acabar directamente. No declínio, no amor como no da vida, ninguém quer resolver-se a evitar a maneira de prevenir os desgostos que ainda estão por vir; ainda se vive para aceitar os males futuros, mas não para os prazeres. Os ciúmes, a desconfiança, o medo de nos tornarmos maçadores e o medo que nos abandonem são males ligados à velhice do amor, tal como as doenças se agarram à demasiado longa duração da vida. Nesta idade, sentimo-nos viver, porque sentimos que estamos doentes, como só sabemos que estamos apaixonados quando sentimos as penas do amor. Só se sai do adormecimento das relações demasiado longas pelo enfado e pelo desgosto de ainda nos vermos agarrados. Enfim, de todas as decrepitudes, a do amor é a mais insuportável.
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