21 de setembro de 2024

O habitante (poesia)



Mia Couto

(ao meu Pai)

***

No silêncio distraído de uma varanda 

que foi o teu único castelo, 

ecoam ainda os teus passos 

feitos não para caminhar 

mas para acariciar o chão.


Nessa varanda te sentas 

nesse tão delicado modo de morrer 

como se nos estivesses ensinando 

um outro modo de viver.


Se o passo é tão celeste 

a viagem não conta senão 

pelo poema que nos veste.

Os lugares que buscaste não têm geografia.


São vozes, são fontes, rios sem vontade 

de mar, tempo que escapa da eternidade.

Moras dentro, sem deus nem adeus.


Mia Couto, 

Vagas e Lumes

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